“Quando chegar a sua vez de saltar para o Nada, você se transformará também num servidor do poder, desfigurado e sem vontade própria. Quem sabe para o que vai servir. E possível que, com sua ajuda, se possam convencer os homens a comprar o que não necessitam, a odiar o que não conhecem, a acreditar no que os domina ou a duvidar do que os podia salvar.”
“Podemos estar convencidos durante muito tempo – anos talvez – de que queremos alguma coisa, se soubermos que nosso desejo é irrealizável. Porém, se de súbito nos vemos diante da possibilidade de este desejo ideal se transformar em realidade, passamos a desejar apenas uma coisa: nunca tê-lo desejado.”
“Vejo agora que minha morte origina a vida e minha vida a morte, e ambas as coisas estão certas. Agora percebo o sentido da minha existência.”
“– O que eu não compreendo é outra coisa, tentou explicar Bastian. Todas essas coisas só aparecem quando eu formulo algum desejo, ou já existiam e eu apenas pressinto, de alguma forma, sua existência?
– As duas coisas, disse Graograman.”
“– É estranho que não possamos desejar aquilo que queremos. De onde virão os desejos? E o que será realmente um desejo? Graograman olhou o rapaz com ar sério, mas não respondeu.”
“– O que significa isso? Faça o que quiser. Deve querer dizer que posso fazer tudo o que me apetecer, você não acha?, perguntou ele. O rosto de Graograman pôs-se de repente muito sério e seus olhos começaram a faiscar.
– Não, disse ele com sua voz profunda e retumbante. Isso quer dizer que deve fazer sua Verdadeira Vontade. E nada é mais difícil do que isso.
– Minha Verdadeira Vontade?, repetiu Bastian, impressionado. E o que significa isso?
– É o seu segredo mais profundo, que o senhor não conhece.
– Então como poderei descobri-lo?
– Seguindo o caminho dos desejos, passando de um para outro até o último. Assim será conduzido até sua Verdadeira Vontade.
– Não me parece muito difícil, opinou Bastian.
– É o mais perigoso de todos os caminhos, disse o leão.
– Por quê?, perguntou Bastian. Eu não tenho medo.
– Não se trata disso, ribombou a voz de Graograman. Esse caminho exige a maior autenticidade e atenção, porque em nenhum outro é tão fácil perder-se para sempre.
– Quer dizer que os desejos que temos nem sempre são bons?, perguntou Bastian.
O leão bateu com a cauda na areia. Levantou as orelhas, franziu o focinho, e os seus olhos cuspiam fogo. Bastian encolheu-se involuntariamente quando Graograman disse, numa voz que fez vibrar o chão:
– E o que o senhor sabe sobre os desejos? O que sabe sobre o que é bom ou não é?"
“Mas há muitas coisas que não se aprendem só pensando, é preciso vivê-las. E foi assim que só muito mais tarde, depois de ter tido a experiência vivida dessas coisas, Bastian recordou-se das palavras de Graograman e começou a compreendê-las.”
“Os monstros, opinou Hykrion, afagando o seu enorme bigode negro, são indispensáveis para que um herói possa ser um herói.”